20 de mai. de 2011

Memórias do meu hemangioma: o que não contei ao Jô - Parte 2






          Desde que comecei a trabalhar, percebi que estava mais exposto a diversas situações e que, a partir de então, nada mais seria como antes. As formas de abordagem seriam maiores, minha exposiçao seria constante assim como as abordagens das pessoas.
           Lembro de uma cena hilária. Estava na agência do banco Bamerindus, lá na Rua Boa Vista...Uma agência comprida, onde pra pegar a fila a gente quase que tinha de pegar um táxi pra chegar no fundo da agência...Já tinha feito todos os meus serviços, cumprimentado todos os funcionários - continuava cara de pau, naquela época... conversava com todo mundo, brincava... era “só alegria” - e já estava me dirigindo pra saída, quando ouvi alguém gritando lá no fundo “Alemão, alemão...”. Voltei-me para atrás e vi um gordinho correndo, se “esgoelando” todo, fazendo gestos para eu parar... Fiquei lá plantado, esperando o cara chegar, pensando que fosse algo importante... Ele chegou todo esbaforido: “Cara, eu pedi pra você esperar por que queria saber o que é isso na tua cara... Sua mãe ficou com vontade de comer alguma coisa?”. Comecei a dar risada do mico que o cara estava pagando e respondi “Sim, e pelo tamanho, devia ser uma melancia bem grande”, virei e fui embora dando risada.

          Outra cena memorável de fila de banco de que me lembro aconteceu na agência do Banespa, na rua Tutóia. Uma senhora estava com o neto, que devia ter uns três anos - criança é sempre sincera e curiosa. O menino me viu e foi direto pra avó perguntar “Vovó, o que é aquilo na cara do moço?”. Ela pegou o menino no colo e disse “Fica quietinho que isso é coisa que pega em curioso...”. Virei pra ela, na minha total cara de pau e lasquei bem alto “Vovó, cuidado que a senhora também vai pegar, hein? Tá curiosa que eu sei...”. Ela ficou com tanta vergonha que foi embora do banco com o menino no colo e eu fiquei dando risada.
          Tem também as histórias nos coletivos (ônibus e metrô). Hoje isso é mais difícil de acontecer, acredito até que seja pela evolução da sociedade, mas na época, uma das coisas que me divertiam era sentar com meu lado direito voltado para o acento do lado. Era batata! As pessoas não sentavam... tinham medo! Mas, às vezes, quando também não estava muito a fim de ver pessoas, naqueles momentos em que estamos revoltados com o mundo, fazia isso para me ver livre, ficar só... era o lado negro da força!
          A adolescência também tem aquele lado poético do primeiro amor, do primeiro beijo, da primeira paixão... mas eu era tímido ao extremo... aliás, minha vida era de um extremo ao outro: era um tremendo cara de pau para muitas situações, e um tremendo fracassso pra chamar uma menina pra sair. (como diria o Charlie Brown, quê pôxa). Era o medo de ser rejeitado! Nunca cheguei a um consenso se eu era tímido porque eu era tímido, ou se tinha relação com o hemangioma, mas... a vida continua até que consegui namorar pela primeira vez com 19 anos e depois disso namorei mais algumas vezes até conhecer minha esposa, com quem estou há 14 anos.
          Depois de adulto tive também momentos mágicos, como o de uma criança de uns três anos, parente do meu cunhado, que numa festa me viu e foi logo falando “Ah, ele tem essa manchinha porque ele tava lá no céu brincando de massinha com os anjinhos... ele sujou o rosto, mas daí teve que vir correndo pra terra e não deu tempo pra limpar”. Essa passagem foi a mais mágica em toda minha vida! Foi algo muito singelo, muito pura!
          Também teve momentos estranhos. Desde o princípio da internet, lá pelos idos de 1995, 1996, sempre participei de salas de bate-papo. Naquele tempo era difícil ter uma foto digitalizada... mas consegui escanear uma foto... só tinha uma! Também não existia o msn... naquele tempo o comunicador era o ICQ. Daí conheci uma moça, começamos a conversar no bate papo (“quer tc daqui, quanto anos de lá, de onde tecla acolá...” e todo aquele papo cibernético). Trocamos ICQ e ficamos conversando por várias horas até que, ela pergunta se eu tenho foto... mandei minha foto pra ela, a moça abriu e respondeu “credo, o que é isso?”. Ela ficou offline do ICQ e acho que deve ter tido um treco, pq nunca mais a vi em lugar nenhum!
          A partir de então, com a solidificação da internet, criação de grupos de discussão, primeiras páginas caseiras, é que tive contato com um grupo no Yahoo em 2002. Me inscrevi e dali surgiram as primeiras pessoas falando sobre hemangiomas e locais para tratamento. Daí em 2004 tivemos nosso primeiro encontro e idealizamos a criação de uma associação de pacientes. Surgiu, então, a Abraphel!

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